quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Acordão STA, declaração de ilegalidade por omissão

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:
0819/08
Data do Acordão:
15-10-2008
Tribunal:
1 SECÇÃO
Relator:
SANTOS BOTELHO
Descritores:
RECURSO DE REVISTAPRESSUPOSTOSLEGITIMIDADE ACTIVA
Sumário:
É de admitir, por versar questão de relevância jurídica, a revista interposta de acórdão do TCA que manteve decisão do TAF que julgou os recorrentes parte ilegítima no âmbito da acção que intentaram, visando a declaração de ilegalidade por omissão de normas administrativas, quando essa questão da legitimidade tenha de passar pela densificação do conceito de prejuízo “directamente resultante da situação de omissão” a que alude o nº 1 do artigo 77º do CPTA, pressuposto este a ser apreciado por referência a parâmetros essencialmente normativos quer os contidos no CPTA quer os decorrentes das garantias contenciosas acolhidas no texto constitucional, portanto com um alcance que extravasa significativamente do caso concreto e poderá servir de referência interpretativa da norma em causa noutras situações.
Nº Convencional:
JSTA0009604
Nº do Documento:
SA1200810150819
Recorrente:
A... E OUTROS
Recorrido 1:
MFIN E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E OUTRO
Votação:
UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1- RELATÓRIO1.1. A… e Outros vêm interpor recurso de revista, ao abrigo do n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, do Acórdão do TCA Sul, de 15-05-2008, que, negou provimento ao recurso jurisdicional por si interposto da decisão do TAF de Almada, de 25-01-2006, que, julgando procedente a excepção da ilegitimidade dos AA, absolveu os RR. da instância - cfr. fls. 176.Na sua alegação os Recorrentes formulam as seguintes conclusões:“ A – Os ora recorrentes têm prejuízo directo com a ausência de regulamentação da norma do Estatuto do Militar da GNR que prevê a possibilidade de os militares licenciados frequentarem um tirocínio (curso) integrarem a classe dos oficiais.B – A interpretação sobre o que se deve entender por “…prejuízo directamente resultante da situação de omissão…” baseia-se em doutrina e jurisprudência antiga e contemporânea do advento do Código Administrativo (1940) e do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo (1957), não atendendo aos objectivos do nosso legislador ao consagrar as acções administrativas especiais de declaração de ilegalidade por omissão de regulamentação.C – A interpretação do Tribunal recorrido sobre o que se deve entender por “…prejuízo directamente resultante da situação de omissão…” torna praticamente impossível o recurso pelos cidadãos e este tipo de garantia pois a inexistência de uma norma regulamentar não é susceptível de por si só causar prejuízo.D – A decisão recorrida infringe a tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos consagrada nos n.ºs 4 e 5 do artigo 268.º da Constituição.” – cfr. fls. 284.Para os Recorrentes as questões enunciadas nas conclusões acabadas de transcrever são de importância fundamental em termos jurídicos, sendo que, por outro lado, a admissão do recurso também se justifica em prol de uma melhor aplicação do direito. 1.2 Nas suas contra-alegações o Recorrido Ministério da Administração Interna vem sustentar, designadamente, a não admissão da revista, por se não verificarem os pressupostos do nº 1, do artigo 150º do CPTA (cfr. fls. 293-302).1.3. Por sua vez, o também Recorrido Ministério das Finanças e da Administração Pública, tendo contra-alegado, pronunciou-se sobre a não admissibilidade do recurso de revista, nos seguintes termos:“ 3- Mas, salvo o devido respeito, não se nos afigura assistir razão aos recorrentes. Com efeito, o presente recurso de revista é inadmissível, desde logo porque interposto em 3.º grau de jurisdição, perfeitamente inadmissível e porque não se verificam os requisitos de que a lei, maxime o Artº 150.º, n.º 1, do CPTA faz depender a interposição do mesmo. Na verdade, o que deve entender-se por “prejuízo directo” ou, na versão do n.º 1 do Artº 77º do CPTA “um prejuízo directamente resultante da situação de omissão” não pode ser tido de forma alguma como uma questão de importância fundamental, pela sua relevância jurídica ou social de que se fala no Artº, nº 1, do CPTA.”“ Por outro lado, também não deixa de ser menos certo que a admissão do presente recurso, a verificar-se, não seria seguramente necessária para uma melhor aplicação do direito.(…)“ Termos em que, por não se verificarem os pressupostos processuais previstos no Art.º 150.º, n.º1, do CPTA, para o recurso (excepcional) de revista, deverá rejeitar-se liminarmente, o presente recurso, com as legais consequências. “ – cfr. fls. 308-3101.4. Cumpre decidir.2- FUNDAMENTAÇÃO2.1. O recurso de revista a que alude o n.º 1, do artigo 150.º do CPTA, que se consubstancia na consagração de um duplo grau de recurso jurisdicional, ainda que apenas em casos excepcionais, tem por objectivo possibilitar a intervenção do STA naquelas situações em que a questão a apreciar assim o imponha, devido à sua relevância jurídica ou social quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.Por outro lado, se atendermos à forma como o Legislador delineou o recurso de revista, em especial, se olharmos aos pressupostos que condicionam a sua admissibilidade, temos de concluir que o mesmo é de natureza excepcional, não correspondendo à introdução generalizada de uma nova instância de recurso, na medida em que das decisões proferidas pelos TCA’s em sede de recurso não cabe, em regra, recurso de revista para o STA. Temos assim, que de acordo com o já exposto, a intervenção do STA só se justificará em matérias de maior importância sob pena de se generalizar este recurso de revista o que, se acontecesse, não deixaria de se mostrar desconforme com os fins obtidos em vista pelo Legislador (cfr., a “Exposição de Motivos”, do CPTA). Vejamos, então. 2.2 Como resulta dos autos, os agora Recorrentes, invocando a sua qualidade de militares da GNR, no activo, que completaram cursos superiores e pretendendo ingressar em quadros previstos no Estatuto do Militar da GNR para os que não sendo oficiais tenham cursos superiores, intentaram contra o Ministério das Finanças e da Administração Pública e o Ministério da Administração Interna uma acção administrativa especial visando a declaração de ilegalidade por omissão de normas administrativas, peticionado a condenação do R. a “aprovar a regulamentação prevista no nº 6 do artigo 195º do Estatuto do Militar da GNR no prazo de seis meses” – cfr. fls. 13. Porém o TAF de Sintra, na sua decisão, de 25-01-06, viria a absolver da instância os RR., com base na ilegitimidade dos AA, aqui Recorrentes, nos termos no nº 1, do artigo 77º do CPTA, já que, em síntese, a falta da norma que os AA pretendiam ver suprida não lhes provocaria uma prejuízo directo para a sua esfera jurídica, uma vez que existiriam “mais pressupostos aleatórios de que dependerá o objectivo dos AA.”, como seja, o processo de recrutamento e a existência de lugar em quadro que ainda faltaria aprovar, não existindo, assim, um prejuízo directo por parte dos AA., agora Recorrentes. Tal decisão foi, posteriormente, sufragada pelo TCA Sul, por via do seu Acórdão, de 15-05-08, que, assim, manteve a pronúncia emitida pelo TAF quanto à ilegitimidade dos AA. (cfr. fls. 236-240). Ora, em face do que quadro em que se moveu o Acórdão recorrido temos que a questão a dirimir no âmbito da presente revista se apresenta como de especial relevância jurídica, por passar, designadamente, pela densificação do conceito de prejuízo “directamente resultante da situação de omissão”, a que alude o nº 1, do artigo 77º do CPTA, para efeitos de legitimidade activa dos AA, pressuposto este que, eventualmente, poderá ser apreciado por referência a parâmetros essencialmente normativos quer os contidos no CPTA quer os decorrentes das garantias contenciosas acolhidas no texto constitucional, portanto com um alcance que extravasa significativamente do caso concreto e poderá servir de referência interpretativa da norma em causa noutras situações, sendo que, na situação em análise, a questão a que se reportam os Recorrentes se anuncia algo complexa, envolvendo a realização de operações exegéticas de uma certa dificuldade, o que tudo reclama a intervenção deste STA.É, assim, de concluir que, no caso dos autos, se verificam os pressupostos de admissão da revista. 3 – DECISÃONestes termos, acordam em admitir o recurso de revista do Acórdão do TCA Sul, de 15-05-08, devendo proceder-se à distribuição dos presentes autos.Sem custas.Lisboa, 15 de Outubro de 2008. – Santos Botelho (relator) - Rosendo José – Angelina Domingues.

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